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Channel: A Marreta do Azarão
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O Cansaço do Torturador

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Antes,
Bastava eu fornecer a cerveja
E uns tira-gostos
(uns amendoins
umas azeitonas,
uns cubos de provolone
e meu cérebro vivo à vinagrete)
Que a madrugada trazia o resto.
Trazia a Lua
As fadas
As rimas
Os voos
As musas circulavam feito putas
Em volta da minha mesa
Com suas bucetas ruivas de sangue
Em busca de um trago.

Perseverante,
Ou sem mais o quê,
Sem outro caminho
(que perseverança só é um nome pomposo que se dá à tacanhez aliada à falta de opções),
Continuo com minha mesa posta,
A cerveja quase gelada,
Umas oferendas salgadas e gordurosas,
E meu cérebro à escabeche.

Porém,
Meus satélites desgarraram-se,
Atraídos por melhores ofertas de emprego,
Por Júpiteres maiores;
Minhas fadas madrinhas
Enfadaram-se de mim,
Me excomungaram;
Meus voos,
Todos cancelados,
Por mau tempo,
Por overbooking;
As musas
Cansaram-se da caridade,
Largaram a batina,
Abandonaram o mecenato,
São todas,
Hoje,
Top models internacionais
A soldo de Midas.

E minha madrugada
Tornou-se em madrugada qualquer,
Igual a de qualquer outro.
Deixou de ser vicinal estrada,
Uma fuga do pedágio,
Outra estada.
Deixou de ser outra estação
De trem
De rádio
Climática.
Passou a ser meramente
Um outro hiato
Um vácuo entre vácuos.
O minuto de descanso
Entre um round e outro.
Os dez minutos para o cafezinho,
Para voltar ao arado,
Ao escritório,
Minimamente são ao sanatório.
Melhor :
Os dez minutos para o cafezinho do torturador,
Que meu descanso é isso,
É a pausa,
É o cansaço do torturador.

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